Carlo Rovelli, em “Grão de pólen em prol da hipótese atômica”

Grãozinho de pólen em prol da hipótese atômica
Carlo Rovelli

A prova definitiva da chamada “hipótese atômica”, de acordo com a qual a matéria é constituída de átomos, teve de esperar até 1905. Quem a encontrou foi um jovem de 25 anos, rebelde e irrequieto, que estudou física, mas não conseguiu encontrar emprego como físico e sobrevivia trabalhando como empregado no departamento de patentes de Berna. Falarei muito desse jovem no restante deste livro, bem como dos três artigos que em 1905 ele enviou à mais renomada revista de física da época, a Annalen der Physik. O primeiro desses artigos contém a prova definitiva de que os átomos existem e calcula a dimensão deles, encerrando definitivamente o problema aberto por Leucipo e Demócrito 23 séculos antes.
O nome do jovem de 25 anos é, obviamente, Albert Einstein.
Como ele fez? A ideia é incrivelmente simples. Poderiam chegar a ela todos os que, desde a época de Demócrito, tivessem a inteligência de Einstein e domínio da matemática suficiente para fazer a conta, esta sim nada fácil. A ideia é a seguinte: ao observar atentamente algumas partículas muito pequenas, como um floco de poeira ou um grãozinho de pólen, suspensas no ar ou em um líquido, vemos que elas tremulam. Impelidas por essa tremulação, movem-se ao acaso, ziguezagueando, e desse modo pouco a pouco vão à deriva, afastando-se paulatinamente da posição de partida. Esse movimento ziguezagueante das partículas num fluido foi denominado “movimento browniano”, em homenagem a Robert Brown, um biólogo que o descreveu com atenção no século XIX. É como se as partículas recebessem chutes aleatórios de um lado e de outro. De fato, não é “como se” recebessem chutes: é isso mesmo que acontece. Elas tremulam porque são empurradas pelas moléculas individuais de ar, que atingem o grãozinho ora pela direita, ora pela esquerda.

O ponto sutil é o seguinte. As moléculas de ar são inúmeras e, em média, as que atingem o grãozinho pela esquerda são tantas quantas as que o fazem pela direita. Se as moléculas de ar fossem infinitamente pequenas e infinitamente numerosas, o efeito dos choques pela direita e pela esquerda se equilibraria exatamente a cada instante, e o grãozinho não se moveria. Mas a dimensão finita das moléculas, o fato de elas terem um número finito e não infinito, causa algumas flutuações (esta é a palavra-chave): ou seja, os choques nunca se equilibram exatamente a cada momento, mas se equilibram apenas em média. Imaginem por um instante que as moléculas fossem poucas e muito grandes: nesse caso, o grãozinho receberia claramente apenas um golpe de vez em quando, ora da direita, ora da esquerda, e, portanto, se moveria de um lado e de outro de maneira significativa, como uma bola chutada por garotos que correm num campo de jogo. De fato, quanto menores são as moléculas, mais os choques se equilibram num pequeno intervalo de tempo, e menos o grãozinho se movimenta. Portanto, com um pouco de matemática, é possível partir da magnitude do movimento do grãozinho, que pode ser observado, e chegar à dimensão das moléculas. Foi o que Einstein fez aos 25 anos. A partir das observações sobre a deriva dos grãozinhos nos fluidos, das medidas do quanto eles “driftam”, ou seja, movem-se à deriva, ele calculou as dimensões dos átomos de Demócrito, dos grãos elementares de que é feita a matéria, e, depois de 2300 anos, forneceu a prova definitiva da exatidão da principal intuição de Demócrito: a matéria é granular.


Carlo Rovelli, em “A realidade não é o que parece”

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